"São inteiramente falsas as notícias que confirmam ter o governo chinês pressionado o seu homólogo português, para que o Dalai Lama não fosse recebido pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, e muito menos chegasse ao Presidente da República. Não faz sentido. Pequim sabia de antemão que jamais o governo de Lisboa lhe faria tal desfeita. Não precisava, portanto, de se fazer lembrar. Com sabedoria milenar, poupou Luís Amado e Cavaco Silva ao enxovalho de um recado. Entre pessoas de bem, isso evita-se.
Pequim só falou com o Parlamento e para cumprir calendário. Sabia que este receberia de qualquer modo o líder espiritual dos tibetanos. Já o fizera uma vez, não deixaria de repetir o gesto.
A escusa do governo e a esquiva do presidente decorrem, garante Luís Amado, de “razões conhecidas”. “Como é óbvio”, rematou ainda. De certo modo, o seu, tem razão.
“Como é óbvio”, por causa do comércio, dos negócios e dos investimentos.
“Como é óbvio”, porque a China é um gigante na cena mundial e Portugal é um país pequeno que não se deve dar a luxos de mestria.
“Como é óbvio”, porque Portugal se insere num espaço, o da União Europeia, onde a regra em vigor é ainda mais hipócrita do que a do pragmatismo.
Porque teríamos de ser nós a fazer a diferença, quando a Europa invoca os Direitos Humanos quando estes são úteis aos interesses e se esquece deles mal estes lho sugiram? Permitam-me o elogio comparado: ao menos Luís Amado é coerente. Os Direitos Humanos não interessam, ponto. Ficam muito bem nos media, aliviam a consciência dos intelectuais, e alimentam os sonhadores. Não são é assunto de Estado.
O nosso MNE é muito prático e porque o é não diz, em voz alta, o que pensa – que o mundo dos poderosos é como é, e só se esta nele com cartas marcadas. Ou alguém julga que o Reino Unido vai tramar a cimeira EU-África porque Mugabe desconhece o que sejam Direitos Humanos? Santa ingenuidade. E alguém pensa que a Europa vai reconhecer a declaração unilateral de independência do Kosovo por respeito aos “pobres albaneses”? Só acredita quem quiser. Então porque haveríamos de ser nós a chatear os chineses, conclui o condenado? Ou, outro exemplo, porque haveriamos de falar com a Frente Polisario, quando até Espanha preferiu o rei de Marrocos e os bancos de pesca, à honra dos saharauis? Na realidade, a politica internacional, mais do que pragmatica, é cínica.
E é também por estas e por outras que o Mundo é o que é, e que a atitude face ao Dalai Lama é uma mera nota de rodapé num país de anedota.
A outra anedota. Muito viaja Luís Amado pelo Médio Oriente. Para ele, é simples: “teremos acordo até ao fim do ano ou o que nos espera é uma enorme tragédia”. Discutindo com intelectuais, espécie duvidosa e dubitativa, ergue alto a confiança: “a alternativa ao optimismo é a tragédia”. Melhor do que ele, só Kourchner, o homólogo francês: “nas próximas semanas, veremos nascer o Estado palestiniano”. Ei-los, qual demiurgos do Altíssimo, profetizando o milagre na Terra Prometida. Perdoa-lhes, Senhor, que não sabem do que falam..."
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