"Viagem à Casa Rolão, sede dos Mão Morta, numa altura em que reeditam os seus quatro primeiros álbuns e se aproxima a edição de um novo disco, "Pesadelo de Peluche".
Em plena Avenida Central, de Braga, repousa uma casa apalaçada em estilo barroco. É um dos pontos do roteiro cultural da cidade: no piso inferior, funciona a activa e recheada livraria Centésima Página. Uma porta no átrio de entrada barra o acesso à história desconhecida do edifício.
Batemos à velha porta de madeira. António Rafael, teclista e guitarrista dos Mão Morta, surge.
Estamos na Casa Rolão. Terá sido construída entre 1759 e 1765, para um industrial bracarense. Já foi a sede do Partido Social Democrata bracarense, nos anos 1970, mas no final dos anos 80 tornou-se a "sede" de uma entidade radicalmente diferente. Propriedade da família de António Rafael, a casa estava desabitada e foi o local ideal para uns Mão Morta em início de carreira assentarem arraiais. O dono original da casa - "um contestatário", assegura Rafael - teria gostado de assistir à evolução da banda...
Nas paredes há marcas de cartazes políticos arrancados à força, deixando para trás a cola peganhenta e eterna que os partidos tanto gostam de usar na propaganda, rabiscos a lápis, uma pintura tosca com a sigla "PSD" - fantasmas de um passado longínquo, dores de cabeça para António Rafael, que quer recuperar a casa e dar-lhe nova vida.
Mais de 20 anos depois de ter sido transformada pelos Mão Morta na sua sede, a Casa Rolão parece ter parado no tempo - isto excluindo a Centésima Página, propriedade da esposa de Rafael.
"Foi aqui que fizemos praticamente toda a nossa vida", diz Adolfo Luxúria Canibal, vocalista do grupo. "[Antes de virmos para aqui] Ensaiávamos em casa do Miguel [Pedro] todos apertadinhos", conta António Rafael.
Chamavam "galinheiro" ao espaço anterior. "Era frio no Inverno e um inferno no Verão. Por isso é que ganhámos uma fobia a ensaiar", brinca Miguel Pedro, baterista. As canções de "Mão Morta" (1988) e "Corações Felpudos" (1990) ainda foram cozinhadas no "galinheiro", mas a partir de "O.D. Rainha do Rock & Crawl" (1991) quase todos os discos foram ensaiados ou gravados na Casa Rolão, sempre em salas diferentes.
Entrar com a banda na casa, classificada como imóvel de interesse público pelo Instituto Português do Património Arquitectónico, é viajar pelo percurso do grupo, que está a comemorar o seu 25º aniversário. O primeiro presente, os quatro primeiros discos da banda reeditados numa única caixa, já está nas lojas e em Abril chegará o segundo, um novo álbum, "Pesadelo de Peluche".
Onde agora funciona a editora do grupo, a Cobra, há um caixote do lixo feito a partir do aquário que Adolfo transportava em palco no espectáculo "Maldoror", o último grande empreendimento dos Mão Morta. Numa sala há outros destroços do percurso já percorrido pela banda: amplificadores, aparelhagens, cassetes VHS, disquetes, livros, um velho órgão Elka, o primeiro em que tocaram.
Numa divisão do piso superior inventaram um estúdio improvisado para gravar "O.D. Rainha do Rock & Crawl". "Íamos gravar ao Mosteiro de Tibães, mas quando chegámos lá a sala que tínhamos escolhido não tinha chão", lembra António Rafael. Sem chão, não havia a acústica perfeita que procuravam. A solução revelou-se positiva. "Estivemos um mês à vontade", conta Adolfo. "O.D. Rainha do Rock & Crawl" foi o primeiro disco com José Pedro Moura, ex-baixista que "traz o heavy metal" para a banda ("Anarquista Duval" é a maior prova dessa influência).
Talvez por isso tenha sido só nessa altura que a banda teve problemas na Casa Rolão. "Ensaiávamos até tarde. Às três da manhã veio cá a polícia. Aqui ao lado havia uma residência e não percebemos que estávamos a exagerar", recorda - sim, os Mão Morta que, em 1989, presenciaram Adolfo a cortar-se com uma faca em palco, com o curioso objectivo de acalmar a multidão arruaceira, e que, em 1993, viram o Theatro Circo de Braga ficar semidestruído pelos fãs, eram bons vizinhos." ler mais
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